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OPINIÃO – Viraremos SAF ou dormiremos no ponto?

Confesso que andei desanimado em escrever qualquer opinião acerca do Santos Futebol Clube já tem um tempo, justamente por enxergar um comportamento no torcedor e associado que reflete bem modelo de raciocínio de qualquer brasileiro acerca de suas posições. Ou você ataca determinado assunto em todos os pontos de forma irracional, ou simplesmente você defende tudo o que está relacionado a discussão como se sua vida dependesse que todo aquele conjunto de fatores tenham exatamente a veracidade que você acredita ter. Falta ponderação na discussão, e quem perde é a instituição que, durante toda nossa vida, nós dedicamos incondicionalmente nosso amor.


Tem algum tempo que eu observo o movimento do futebol nacional em aceitar o modelo empresarial de gestão, a famigerada SAF (Sociedade Anônima do Futebol), que na prática, é uma empresa cuja atividade principal consiste na prática do futebol em competições profissionais, modelo utilizado com muita frequência na Europa e Estados Unidos (cuja a liga nacional, a MLS tem crescido de maneira assustadora em termos econômicos), diferente do modelo tradicional de clubes no Brasil, que até a promulgação da lei 14.193/2021, em agosto passado, não tinha fins lucrativos e tinham natureza de associação esportiva. O famoso clube.


Basicamente a diferença é que na SAF o clube tem dono ou acionistas, e podem buscar o lucro. Na associação esportiva, o clube tem gestores (presidentes) eleitos, e todo o superávit (lucro) do exercício fiscal (ano de 2022 por exemplo), deverá ser reinvestido no clube de alguma forma. Lindo não? A olho nu eu olho e penso, putz… eu posso escolher o gestor, o lucro vai ser reinvestido em estrutura ou contratações, eu como associado eu tenho poder de escolha que pode gerar algo benéfico para o clube… prefiro que o clube continue como clube, e assim os torcedores preservarão sua história e tradição. Sério? Como está nosso desempenho nos últimos 10, 20 anos?


O retrato disso é a foto que tem circulado todas as mídias sociais e grupos destinados ao Santos Futebol Clube de dois conselheiros dormindo enquanto assuntos sérios referente ao clube estavam sendo discutidos. Temos um estatuto que em suas letras no arquivo PDF com uma bela marca d’agua, formam um texto lindo que não consegue se materializar na prática em algo benéfico ao clube. Há quem diga que não houve ainda qualquer momento em que o Estatuto Social foi plenamente aplicado, e por isso não haveria como saber se o mesmo é falho. Eu digo que, se houve inobservância do Estatuto por parte de algum gestor, e ele não foi penalizado pelo Conselho Deliberativo, ou algum conselheiro deixou de ter conduta compatível com as normas descritas como aceitáveis no tal documento, e nenhuma ação punitiva foi tomada contra este que feriu o clube, o Estatuto já se mostrou falho.

Temos um aborto da natureza chamado Comitê de Gestão, que foi criado pelo ex-presidente Luis Álvaro, creio eu, com medo de que seu antecessor pudesse voltar para a cadeira presidencial e pudesse tomar as decisões que envolvessem a gestão do clube de maneira monocrática, trazendo na figura dos gestores sempre o contraponto para dentro do núcleo em forma de votações, que quando é utilizado da maneira que o Estatuto prevê, traz uma demora incrível para decisões que precisam ser dinâmicas na área do futebol (veja isso em escolha de técnico ou contratações ano passado e nesse ano), e de resto, só serve para fazer alianças políticas para satisfazer os grupos que participam das eleições.

Temos um Conselho Deliberativo que em parte é formado por verdadeiros “semi-deuses” efetivos, e mais trocentas cadeiras eletivas em que muitos estão lá apenas para ter o título de conselheiro do Santos Futebol Clube, alguns para tirar uma soneca durante a reunião virtual e outros para encher caravana, ou, como no caso da final da Libertadores em que havia número reduzido de ingressos, ser alguém distinto e ter preferência por não ser um “torcedor comum”.

Conselho Deliberativo que é composto por votação indireta, ou seja, o associado vota no presidente e o presidente escolhe os trocentos… agora, imagine você, presidente do Santos, conseguiria indicar 200 pessoas para te aconselhar de maneira substancial? Fora isso, o estatuto coloca uma clausula de que se o candidato não chegar nos 20% dos votos, não comporá em nenhuma porcentagem as cadeiras do Conselho. Logo, em uma eleição com 6 candidatos, como a de 2019, totalmente fragmentada, apenas o atual mandatário conseguiu ultrapassar essa marca, indicando assim a TOTALIDADE do Conselho Deliberativo que tem como função, fiscalizar a atual gestão. Parece absurdo, eu escolher todos os que terão o direito de me oferecer qualquer tipo de oposição institucional, certo? Pois é, no Santos isso ocorre.

Talvez por isso chegamos ao ponto de ter uma divida do tamanho da que tivemos, talvez por isso tomamos trasferban, tivemos ativos penhorados, salários atrasados enquanto cartão corporativo era utilizado da maneira mais vil possível. E tudo isso com o meu e o seu voto.

Como não bastasse, nos últimos meses o presidente Andres Rueda já disse diversas vezes, seja para torcidas organizadas, quanto para a imprensa convencional, de que não há qualquer possibilidade do clube virar SAF. E aí eu me questiono, poque será? Porque há tantos conselheiros que são contra isso? Para não perder a soneca nas reuniões via Zoom?

Muitos são contra o clube ter dono, e alegam que o dono poderia mudar o emblema, mudar o nome, mudar as cores, renegar a história e a tradição… blá blá blá. Façamos um exercício básico de imaginação onde você, meu caro leitor, é o CEO de uma empresa, digamos que da Apple. Você sabe que tem gente que vai pagar o quanto for no seu celular, por causa do status, do sistema operacional, por causa do design, por conta da compatibilidade com outros dispositivos e todas as justificativas que os usuários usam pra justificar tamanho investimento. E aí você se depara com uma oferta de outro sistema operacional oferecendo um corte nos gastos, e um designer oferecendo outra logo, que ao invés de uma maçã, será um robozinho verde. Tenho certeza que você sabendo o perfil do seu consumidor, jamais levará a Apple para esse caminho. Pois bem, nenhum CEO de uma SAF fará mudanças que desagradem seu consumidor que é o torcedor, porque assim ele estaria desvalorizando sua empresa frente ao seu público que é específico. O Santos não irá convencer consumidores de outros times a ser santista e ninguém vai rasgar dinheiro por capricho. Conheço gente que se aperta todo pra ter o celular ou o carro mais atual de determinada marca, você acha que o Santos perderia torcida por isso?


Outros são contra porque simplesmente não quer que sua paixão dê lucro para quem visa enriquecimento. Tenho uma péssima notícia pra você… muita gente no meio do futebol tem enriquecido às custas do teu time, enquanto teu time não tem CT de base, não tem CT feminino, não consegue colocar 13 mil em um estádio, e não tem dinheiro pra contratar jogadores decentes. Todo o lucro parte da premissa de investimento, tanto em estrutura, quanto em marketing e na formação de elenco profissional. Não há lucro sem investimento, e hoje não temos investimento e só temos dívidas, tudo isso fruto do sistema apodrecido que impera no clube. Aliás, imaginem quanto tempo demoraria para um CEO demitir (ou nem contratar) André Mazzuco entre outros.


Vi também alguém falar sobre o caso que o Chelsea, bi campeão da Champions League e inúmeras vezes campeão da Premier League sob comando de Abramovich, estar a venda por conta da nacionalidade russa de seu dono. Meus amigos, vocês estão se abraçando em um caso extremamente atípico, para apontar um problema no meio de vários exemplos de sucesso. Qual outra guerra levou ao congelamento de ativos como essa? Quantos Putins vão existir? Quantas guerras iremos enfrentar? Se pautarmos toda a nossa vida no “e se”, tenho certeza que infelizmente não será apenas nessa guerra sem sentido que teremos terra arrasada, mas também no nosso clube que nas palavras do Mano Brow “todo semestre flerta com o rebaixamento”.


E por fim, hoje, é impossível ser competitivo e responsável com as contas, com o nível que Palmeiras (Crefisa), Atlético-MG (BMG e que já quer virar SAF) e Flamengo, que tem exposição nacional enorme da mídia, atraindo bilheteria e patrocinadores, colocaram em seus elencos por meio do poderio financeiro. Red Bull Bragantino, com organização empresarial e sem nenhuma torcida, conseguiu em 2 anos de serie A estar na libertadores. Botafogo, Cruzeiro e Vasco, três grandes times do futebol nacional precisaram passar pelo inferno do rebaixamento para se estruturar a ponto de entender que o único meio de voltar ao protagonismo é tirar de dentro de si essa estrutura falida estatutária que deixa o clube na mão de senhores aposentados enquanto a divida multiplica ao mesmo modo que os vexames esportivos. Até hoje a mística da nossa camisa, a magia do clube de Vila Belmiro e os deuses do futebol tem segurado nossa história de glórias de maneira imaculada. Mas talvez seja a hora de entrarmos em uma nova era para que não haja sofrimento excessivo que danifique nossa imaculada honra antes de aceitarmos o futuro.

 

                                                                      ** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do Meu Peixão

2 Comments

Comentário(s)

  1. Francisco

    15 de março de 2022 at 16:41

    Perfeito!! Irretocável!

  2. Andre Lucas

    15 de março de 2022 at 15:41

    É meu amigo, esse é o retrato do nosso Santos. Nem os próprios dirigentes respeitam o clube.

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